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terça-feira, 19 de setembro de 2017

Sobre sociologia, teatro negro brasileiro e Roger Bastide

 

 

 

Sobre sociologia, teatro negro brasileiro e Roger Bastide

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



Primeiramente: para contextualizar, este foi um texto desenvolvido no âmbito acadêmico como resenha de um capítulo retirado do livro Roger Bastide: sociologia.
 
Roger Bastide (Nîmes, 1 de abril de 1898 — Maisons-Laffitte, 10 de abril de 1974) foi um sociólogo francês. Em 1938 integrou a missão de professores europeus à recém-criada Universidade de São Paulo, para ocupar a cátedra de sociologia. No Brasil, estudou durante muitos anos as religiões afro-brasileiras, tornando-se um iniciado no candomblé da Bahia. Apesar de sua aproximação com as religiões afro-brasileiras o sociólogo era protestante, Bastide era membro da Primeira Igreja Presbiteriana Independente de São Paulo. 
Uma de suas obras mais importantes é O Candomblé da Bahia, reeditada em 2001 pela editora Companhia das Letras. Outra obra que merece destaque é As Américas negras: as civilizações africanas no Novo Mundo, editada pela EDUSP em 1974.















Roger Bastide: sociologia – Cap.5: A Sociologia do Teatro Negro Brasileiro

Por vezes, na arte não vemos ou, pelo menos, não reconhecemos obras de artistas negros, no teatro é ainda mais complicado e raro de conhecer algo que preencha a lacuna desta representatividade. Como um artista da cena pode conviver e se relacionar com esta realidade? Para analisar, apreciar e criar no campo das artes cênicas encontramos no entendimento da sociologia um amparo científico consistente e enriquecedor e que pode trazer luz sobre esta questão. Dentro da análise sociológica aqui estudada para compreender a expressão de um teatro negro brasileiro faz-se necessário com o estudo de Roger Bastide (1898 – 1974) uma retrospectiva histórica e abrangente, para posteriormente focar na temática do teatro negro brasileiro. Faço aqui uma leitura do texto do autor, apresentando as ideias dele em relação ao assunto.
Bastide inicia este capítulo com uma breve retrospectiva entorno da história do teatro e enuncia que o teatro “foi, de Ésquilo a Shakespeare, a expressão viva de toda uma comunidade”. Mas a partir do Renascimento ocorrem vários conflitos entre classes e grupos sociais, o que envolverá o teatro diretamente por consequência.
A partir do século XVIII, uma só classe vai dominar, a classe burguesa, e o teatro vai se tornar expressão unicamente dessa classe. Entretanto segundo o autor veremos posteriormente mutações profundas das antigas estruturas sociais, com novas classes e novos grupos que mesmo tendo capacidade porém não possuem poder. Essas revoluções nas estruturas levarão ao nascimento de novas aspirações que contestaram o teatro das antigas estruturas. Dito isto, o autor indica que o teatro negro só pode ser compreendido se integrado à crise mundial do teatro. O teatro burguês perdeu o caráter litúrgico e busca na cultura africana, em seus rituais e danças referência para encontrar um teatro essencial, Roger Bastide aponta que a partir desse processo o teatro-ritual religiosos, supera o teatro do século XIX dando destaque ao teatro negro. O teatro negro brasileiro é analisado pelo autor divido em duas partes, folclórico e teatro experimental dos anos 50, havendo dois tipos de teatros folclóricos, um criado pelos brancos para garantir a dominação e um outro com origem afro-brasileira (banto e nagô).

O autor nos traz primeiramente como exemplo desses teatros populares o combate entre mouros e cristãos, criado pelos brancos, coloca os escravos negros no papel de mouros, os eternos vencidos, com o objetivo principal de “desafricanizar” os negros integrando eles na cultura da nova sociedade branca. O autor ainda coloca como segundo exemplo de teatro popular de mesma origem do primeiro, o Bumba-meu-boi, que mostra uma imagem estereotipada dos negros onde é colocado como irresponsável, violento e selvagem, entre outros vícios, e bem como a luta de mouros e cristãos este jogo de representação também serve para dizer como o negro deve se comportar, assumindo comportamento, religião e costume dos patões brancos. 

Posteriormente examina a outra vertente folclórica do teatro brasileiro, Bastide passa a discorrer sobre o teatro popular de origem africana, tomando agora como exemplo o samba rural, jogo de enigmas codificado nas particularidades dos negros é um teatro do segredo, como forma de proteger a identidade e cultural ameaçada pelos brancos sendo uma dramatização de uma vivência coletiva e como outro exemplo o autor aponta o candomblé, como expressão dos desejos inconscientes de um ideal de sociedade que preenche uma função catártica, representada em estado de transe, e conforme a mudança da sociedade ocorre também ocorrem mudanças no candomblé para expressar o inconsciente do negro, com o tempo as petrópolis faram esse teatro se tornar puro folclore e o teatro erudito emergir dos intelectuais, escrito para os próprios negros e para os brancos.
Quanto ao teatro erudito, o autor diz que surge um teatro negro depois da Segunda Guerra Mundial, que vendo como o teatro dos brancos representava os negros através do discurso pintando com esteriótipos, logo era inferiorizador, porém mais potente na comunicação que o teatro popular dos negros, que apenas se utilizava de mímicas e danças. Este novo teatro dos negros recorreu a apropriação do discurso e assim passa a adquirir um maior valor pedagógico em sua expressão. Não só no Brasil, mas nos Estados Unidos e na África também em meados do fim da Segunda guerra mundial foram criados teatros de discurso com os mesmos objetivos, assumem então um caráter estratégico na busca por uma identidade, cuja importância num contexto maior seja percebida e reconhecida.
Com os anos percebeu-se a falta de dramaturgos negros e temáticas, é neste contexto também que surge o Teatro Experimental Negro, com objetivo de valorizar a beleza e importância do negro, fazendo ele aparecer no papel de herói. Contra qualquer ideologia de embranquecimento, fortalecendo a possibilidade do negro ser brasileiro sem rejeitar sua negritude.

Ao longo dos anos o negro recusou uma negritude que seria um racismo invertido, para se ver como subdesenvolvido e combinado a brancos subdesenvolvidos passam a desenvolver uma nova integração, à nova ideologia dos negros de melhoramento das condições econômicas da vida, medidas sociais, estudos e até buscar assim ascensão social.
Identificação e representatividade faz muita diferença, quando falamos sobre ascensão social. Ainda mais no teatro, uma arte da presença, da possibilidade do discurso e da potência presente na performatividade da cena, é impossível o teatro brasileiro crescer realmente em sua total potencialidade enquanto houver desigualdades pendentes, lacunas no meio artístico não preenchidas não por falta de competência, mas provavelmente por falta de oportunidade e visibilidade. Dito isto, vejo aqui apropriado trazer um exemplo positivo, o teatro negro brasileiro recentemente esteve muito bem representado com a maior exemplificação de representatividade e empoderamento de uma identidade racial possível atualmente, neste ano esteve em cartaz aqui no Paraná Macumba: Uma gira sobre o poder da Companhia Transitória de Curitiba. Uma peça muito bem desenvolvida, que demonstra o fortalecimento para as referências negras no teatro brasileiro. Um espetáculo que, em minha opinião, aponta a importância de reconhecer a beleza, grandiosidade e força da nossa cultura afro-brasileira.
É apenas uma lástima grande que no Brasil, com a maior parte da população sendo negra não se tenha uma produção proporcionar no teatro. Com base no estudo de Bastide, vemos ser reflexo de um passado terrível combinado com baixas oportunidades de ascensão social e alto índice de analfabetismo, ou seja, a pouca escolaridade reflete também que cultura num sentido amplo necessitada ser cultivada em todas as esferas da sociedade mas em principal nas instituições de ensino.
Para analisar, apreciar e criar no campo das artes cênicas encontramos no entendimento da sociologia uma explicação que nos remedia mas não nos soluciona a relação com o discurso que está ainda distante do negro no teatro brasileiro, poderemos um dia continuar então atrás da luz sobre este problema sociais. Por vezes, na arte não vemos ou, pelo menos, não reconhecemos obras de artistas negros, no teatro é ainda mais complicado e raro de conhecer algo que preencha a lacuna desta representatividade, como seria bom ter fresco na memória dezenas de espetáculos como “Macumba” para refletir sobre o teatro negro brasileiro.










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